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segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A crise no Império e a Proclamação da Republica no Brasil

Não houve um só tiro que pudesse revelar que se tratava de um golpe e não de um desfile. Se disparos ecoassem (de fato, houve dois, mas ninguém os escutou), talvez aqueles 600 soldados percebessem que não estavam ali para participar de uma manobra, mas para derrubar um regime.
Na verdade, vários militares, ali presentes, sabiam que estavam participando de uma quartelada. Mesmo os que pensavam assim achavam que quem estava caindo era o primeiro-ministro de Ouro Preto. Jamais o Imperador D. Pedro II - muito menos a monarquia que ele representava.
Não é de se estranhar a ignorância dos soldados do 1° e do 3° Regimento de Cavalaria e do 9° Batalhão. Afinal, até poucas horas antes, o próprio líder do golpe estava indeciso. Mais: estava doente, de cama, e só chegou ao Campo de Santana quando os canhões já apontavam para o quartel. Talvez ele não tenha dado o "Viva o Imperador!" que alguns juraram ouvi-lo gritar. Mas com certeza, impediu que pelo menos um cadete berrasse o "Viva a República!", que supostamente estava entalado em muitas gargantas.
A cena foi bem estranha. Montado em seu belo cavalo, o Marechal Deodoro da Fonseca desfilou longa lista de queixas, pessoais e corporativas, contra o governo - o governo do Ministro Ouro Preto, não o do Imperador. O Imperador - isso ele fez questão de deixar claro - era seu amigo: - Devo-lhe favores. Mas o Exército fora maltratado.
Por isso, derrubava-se o Ministério. Difícil imaginar que Deodoro estivesse dando um golpe, anda mais golpe republicano - ele era monarquista. Ao seu lado estava o tenente-coronel Benjamin Constant, militar que odiava andar fardado, não gostava de armas e tiros e, até cinco anos antes, também falava mal da República.
Ambos, Deodoro e Constant, contavam agora com o apoio de republicanos civis. Mas não havia sinal de "paisanos" por perto - esses apenas tinham incentivado a aventura golpista dos dois militares (por coincidência ou não, dois militares ressentidos). O fato é que naquela mesma hora, o Ministro Ouro Preto foi preso e o gabinete derrubado. Mas ninguém teve coragem de falar em República.
Só à noite, quando golpistas civis e militares se reuniram, foi que proclamaram - em silêncio e provisoriamente - uma República Federativa. "Provisoriamente", porque se aguardaria o pronunciamento definitivo da Nação, livremente expressado pelo sufrágio popular.
E o povo a todas essas?
Bem, o povo assistiu a tudo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava, disse Aristides Lobo. Embora Lobo fosse republicano convicto e membro do primeiro Ministério, seu depoimento tem sido contestado por certos historiadores (que citam as revoltas populares ocorridas na época).
De qualquer forma, o segundo reinado, que começara com um golpe branco, terminava agora com um golpe esmaecido. A monarquia, no Brasil, não caiu com um estrondo, mas com um suspiro. E o plebiscito para referendar a República foi convocado em 1993 - com 104 anos de atraso. O Império já havia terminado.
DOCUMENTOS HISTÓRICOS DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA DO BRASIL
A proclamação da República foi marcada por dois documentos que possuem tons diferentes: A Proclamação ao Povo Brasileiro, que instaura o novo regime, busca tranqüilizar a população, manter a legitimidade dos funcionários do Estado até novas mudanças, e garantir o cumprimento dos compromissos financeiros com outros países e o Decreto Nº 1, que mostra sua face impositiva, "decretando" a validade do regime em todas as províncias e afirmando a intenção do Governo Provisório em intervir em caso de oposição.
A leitura de ambos oferece um rico exercício comparativo.
PROCLAMAÇÃO DOS MEMBROS DO GOVERNO PROVISÓRIO
Concidadãos!
O Povo, o Exército e a Armada Nacional, em perfeita comunhão de sentimentos com os nossos concidadãos residentes nas províncias, acabam de decretar a deposição da dinastia imperial e conseqüentemente a extinção do sistema monárquico representativo.
Como resultado imediato desta revolução nacional, de caráter essencialmente patriótico, acaba de ser instituído um Governo Provisório, cuja principal missão é garantir com a ordem pública a liberdade e o direito do cidadão.
Para comporem este Governo, enquanto a Nação Soberana, pelos seus órgãos competentes, não proceder à escolha do Governo definitivo, foram nomeados pelo Chefe do Poder Executivo os cidadãos abaixo assinados.
Concidadãos!
O Governo Provisório, simples agente temporário da soberania nacional, é o Governo da paz, da fraternidade e da ordem.
No uso das atribuições e faculdades extraordinárias de que se acha investido, para a defesa da integridade da Pátria e da ordem publica, o Governo Provisório, por todos os meios ao seu alcance, promete e garante a todos os habitantes do Brasil, nacionais e estrangeiros, a segurança da vida e da propriedade, o respeito aos direitos individuais e políticos, salvas, quanto a estes, as limitações exigidas pelo bem da Pátria e pela legítima defesa do Governo proclamado pelo Povo, pelo Exército e pela Armada Nacional.
Concidadãos!
As funções da justiça ordinária, bem como as funções da administração civil e militar, continuarão a ser exercidas pelos órgãos até aqui existentes, com relação às pessoas, respeitadas as vantagens e os direitos adquiridos por cada funcionário.
Fica, porém, abolida, desde já, a vitaliciedade do Senado e bem assim o Conselho do Estado.
Fica dissolvida a Câmara dos Deputados.
Concidadãos!
O Governo Provisório reconhece e acata os compromissos nacionais contraídos durante o regime anterior, os tratados subsistentes com as potências estrangeiras, a dívida pública externa e interna, contratos vigentes e mais obrigações legalmente estatuídas.
Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisório.
Aristides da Silveira Lobo, Ministro do Interior.
Tenente-coronel Benjamin Constant Botelho de Magalhães, Ministro da Guerra
Chefe de Esquadra, Eduardo Wandenkolk, Ministro da Marinha.
Quintino Bocaiúva, Ministro das Relações Exteriores e interinamente da Agricultura, Comércio e Obras
DECRETO Nº 1
O Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil decreta:
Art. 1o - Fica proclamada provisoriamente e decretada como a forma de governo da nação brasileira a República Federativa.
Art. 2o - As províncias do Brasil, reunidas pelo laço da federação, ficam constituindo os Estados Unidos do Brasil.
Art. 3o - Cada um desses Estados, no exercício de sua legítima soberania, decretará oportunamente a sua Constituição definitiva, elegendo os seus corpos deliberantes e os seus governos locais.
Art. 4o - Enquanto, pelos meios regulares, não se proceder à eleição do Congresso Constituinte do Brasil e bem assim à reeleição das legislaturas de cada um dos Estados, será regida a nação brasileira pelo Governo Provisório da República; e os novos Estados pelos Governos que hajam proclamado ou, na falta destes, por governadores delegados do Governo Provisório.
Art. 5o - Os governos dos Estados federados adotarão com urgência todas as providências necessárias para a manutenção da ordem e da segurança pública, defesa e garantia da liberdade e dos direitos dos cidadãos, quer nacionais, quer estrangeiros.
Art. 6o - Em qualquer dos Estados, onde a ordem pública for perturbada e onde faltem ao governo local meios eficazes para reprimir as desordens e assegurar a paz e tranqüilidade públicas, efetuará o Governo Provisório a intervenção necessária para, com o apoio da força pública, assegurar o livre exercício dos direitos dos cidadãos e a livre ação das autoridades constituídas.
Art. 7o - Sendo a República Federativa Brasileira a forma de governo proclamada, o Governo Provisório não reconhece nem reconhecerá nenhum governo local contrário à forma republicana, aguardando, como lhe cumpre, o pronunciamento definitivo do voto da nação livremente expressado pelo sufrágio popular.
Art. 8o - A força pública regular, representada pelas três armas do Exército e pela Armada nacional onde existam guarnições ou contingentes nas diversas províncias, continuará subordinada exclusivamente dependente do Governo Provisório da República, podendo os governos locais, pelos meios ao seu alcance, decretar a organização de uma guarda cívica destinada ao policiamento do território de cada um dos novos Estados.
Art. 9o - Ficam igualmente subordinadas ao Governo Provisório da República todas as repartições civis e militares até aqui subordinadas ao governo central da nação brasileira.
Art. 10 - O território do Município Neutro fica provisoriamente a administração imediata do Governo Provisório da República e a cidade do Rio de Janeiro constituída, também, provisoriamente, sede do poder federal.
Art. 11- Ficam encarregados da execução deste decreto, na parte que a cada um pertença, os secretários de Estado das diversas repartições ou ministérios do atual Governo provisório.
Sala das sessões do Governo Provisório, 15 de novembro de 1889, 1o da República.
(Ass.) Marechal Manuel Deodoro da Fonseca, chefe do Governo Provisório; S. Lobo; Rui Barbosa; Q. Bocaiúva; Benjamin Constant; Wandenkolk Corrêa
(Pesquisa em vários sites)

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