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terça-feira, 2 de novembro de 2010

O COLAR DE MARIA ANTONIETA

O assunto do colar foi uma fraude que teve por vítima, em 1785, ao cardeal de Rohan, bispo de Estrasburgo, e no que se viu implicada a rainha María Antonieta. A relevancia pública do assunto, que resultou em um grande escândalo político e social, contribuiu a afundar a imagem pública da rainha María Antonieta, que se ganhou definitivamente a inimizade da velha nobreza francesa e perdeu o apoio do povo da França. As consequências disto espolearon o descontentamento popular contra o governo de Luis XVI, muito influenciado pela camarilla da rainha. O torpe manejo que a monarquia francesa fez do assunto levaram a que começasse a ser abertamente desprestigiada pela própria nobreza, socavando de maneira fundamental a imagem pública da monarquia em uns momentos de crise económica e social; igualmente, pôs de manifesto ante o povo a corrupção do corte e a precariedad das finanças públicas, até o ponto de que o Assunto do Colar costuma se considerar como um claro antecedente à Revolução Francesa.
Por sua vez, o carácter profundamente novelesco do assunto, qualificado como "uma das farsas mais descaradas da História" por Stefan Zweig, tem servido como tema de numerosas obras literárias, entre elas, "O Grande Copto", poema de Goethe, ou a novela "L’Affaire du collier de reine-a" de Alejandro Dumas, tema mais tarde tomado por Hollywood para dar lugar a um filme.

Origens da fraude

 As origens da fraude encontram-se na instigadora cabeça de Jeanne Valois da Motte. Esta mulher, ainda que descendente da Casa Real dos Valois, tinha nascido na mais profunda pobreza, filha de um nobre empobrecido, Jacques de Saint-Rémy, quem, pese a ser um autêntico descendente da Casa de Valois, não tinha mais meios de subsistência a não ser a caça furtiva. A mãe de Jeanne, por sua vez, era de origem plebeia, e depois da morte de seu marido Jacques, teve que se dedicar à prostituição ao mesmo tempo em que obrigava a sua filha a exercer a mendicancia. Aos sete anos,  pedia esmola por um caminho próximo a Paris, Jeanne cruzou-se com o carro da marquesa de Boulainvilliers, a quem relatou sua história. A extraordinária circunstância de que alguém de sangue real pudesse estar a exercer a mendicancia fez co que a Marquesa se apiedasse de Jeanne e a acolhesse. Encontrou-a praça em um pensionato para filhas de nobres pobres onde Jeanne foi educada para ser freira. No entanto, a profunda ambição de Jeanne de Valois cedo chocou com o ambiente religioso do pensionato, do qual  escapou aos vinte e dois anos.

Depois de vagar um tempo pela França, Jeanne reapareceu em Bar-sul-Aube, onde estava acantonado um destacamento do exército francês. Depois de apresentar-se como Jeanne de Valois, entabulou relações com um oficial chamado Nicolas da Motte, com o que contrairia casamento. No entanto, os meios de seu marido eram escassos, pelo que decide usar sua ascendência como membro da Casa de Valois para ascender socialmente. Para isso recorre à pessoa de mais alta influência que conhece, sua antiga patroa, a Marquesa de Boulainvilliers, que a recebe no castelo do Cardeal de Rohan, a quem é apresentada.

O Cardeal do Rohan, ainda que de escassos dotes pessoais, era um dos prelados católicos mais ricos e importantes da França. Membro de uma das principais famílias da nobreza francesa, os Rohan, representava a diócese de Estrasburgo, uma das mais ricas da França, e era por isso mesmo o langrave da Alsacia; ademais, era o grand aumônier da corte (isto é, Grande Limosnero da França, máxima autoridade religiosa do corte de Versalles), pelo que controlava todos os donativos e obras de caridade do Rei da França, abade da riquísima abadia de Saint-Vaast, e provisor (financiador) da Sorbona. O carisma pessoal de Jeanne de Valois faz que cedo seja uma frequentadora assidua à camarilla do cardeal, e Jeanne de Valois não duvida em usar seu nome para associar-se com o mesmo, a quem cedo vê como a um pobre ingênuo do que obtém um posto de capitão da guarda real para seu marido, o título de condes de Valois da Motte para ambos, e o pagamento de todas as dívidas que o casal tinha contraído até então.

No entanto, sua ambição pessoal não para aí, e decide dar um passo a mais se apresentando, como Condesa de Valois da Motte, na Corte de Versalles, onde pretende introduzir-se nos círculos íntimos da Rainha María Antonieta. No entanto, pese a suas tentativas, não tem sucesso: não consegue ser apresentada à Rainha, ainda que seu nome e sua pessoa fossem conhecidos na Corte, onde começa a se deixar ver com freqüência. Seu fracasso, em vez de desanima-la, a incentiva para seguir ascendendo socialmente. Ante suas imensas despesas pessoais, começa a usar o fato de ser recebida na Corte para obter grandes somas de dinheiro dos prestamistas de Paris, aos que cedo sugere que pertence ao círculo íntimo da Rainha e da íntima amiga desta, madame de Polignac. Pese a ser totalmente falso, tal rumor começa a circular por Paris, o qual, junto com seu regio apelido e seu fastuoso padrão de vida faz que se lhe abram as portas da mais alta sociedade, que espera congraciar-se com ela. O fechado e exclusivo dos círculos da Rainha ajuda a tal fim, pois ninguém está em condições de refutar a pretendida amizade da condesa com María Antonieta, e suas contínuas visitas a corte fazem crer a todos o contrário.

A fraude ao cardeal de Rohan

O cardeal de Rohan Jeanne não descuida a seu antigo conhecido, o cardeal de Rohan, quem, se talvez por sua torpeza pessoal, se encontrava em desgraça nos círculos da rainha, aos que ambicionava pertencer como modo de ser nomeado, a instâncias da Rainha, premiê da França. Sua ingenuidade leva-lhe a achar que Jeanne de Valois realmente é íntima amiga da Rainha, pelo que cedo sugere àquela a possibilidade de que o ajude a congraciar-se de novo com María Antonieta. Em 1784, Jeanne de Valois começa a insinuar que sua suposta intima amiga estaria disposta a rejuntar-se com o cardeal. Começa a transmitir-lhe supostos comentários verbais da rainha, encaminhados a que o cardeal deduza que, ajudando economicamente a Jeanne de Valois, a rainha estaria disposta a receber de novo ao cardeal.

O casal Valois da Motte, ajudado por um tal Marc Rétaux de Villette, suposto secretário do conde e, em realidade, amante da condesa, começa assim a sangrar ao cardeal, de quem obtêm grandes somas de dinheiro (umas 60.000 libras inicialmente) com as que saldam dívidas, contraem outras, e, em definitivo, vivem por todo o alto. Em maio de 1784, para satisfazer a insistencia do cardeal, que se vai pondo a cada vez mais nervoso ante a falta de progressos no assunto da reconciliação, Jeanne de Valois toma uma decisão arriscada ao sugerir ao cardeal que, na próxima recepção real em Versalles, a rainha fá-lhe-á um verdadeiro gesto, sinal dos progressos na reconciliação. Ainda que o gesto da rainha não fosse mais que uma leve inclinação de fria cortesía para o principal prelado do corte, o cardeal o interpreta como o combinado sinal, e em agradecimiento para Jeanne de Valois, paga algumas dívidas da mesma.

Depois deste passo, faz-se evidente que o cardeal não poder-se-á contentar com meras mensagens verbais, e o casal Valois e Rétaux de Villette dão mais um passo mais na fraude ao cardeal. Este último, hábil calígrafo, redige uma carta na que María Antonieta perdoa ao cardeal, ao mesmo tempo em que se desculpa de não poder o receber publicamente, sugerindo a possibilidade de um encontro secreto. Cheio de alegria, o cardeal deixa-se sangrar ainda mais pelos Valois da Motte; recebe umas cartas mais de reconciliação e cedo começa a pedir, de maneira insistente, que Jeanne marque um encontro com a Rainha. A investigação posterior ao escândalo assinalará a incrível ingenuidade do cardeal, pois alguém de sua confiança teria que ter reconhecido as cartas recebidas como falsas ao ver que estavam assinadas com um María Antonieta da França, quando a Rainha assinava só María Antonieta.

Nessa época, cita-las galantes com mantos e capas nos bosques de Versalles faziam furor. A condesa da Motte tem descoberto a uma prostituta, Nicole Leguay, no Palais Royal de Paris, muito parecida à rainha. Contata com ela e consegue  convence-la para que se faça passar pela Rainha com o fim de ganhar uma aposta de um amigo. Depois de aliciar à prostituta sobre o que tem de dizer a dito amigo, e depois de a vestir com uma réplica de um conhecido vestido de María Antonieta, marca um encontro noturno com o cardeal. Assim, a noite do 11 de agosto de 1785, introduz à "falsa rainha" nos jardins de Versalles, e, pouco antes da alva, esta se encontra no bosque de Vénus com um aturdido cardeal, que crê ver nela a María Antonieta. A "falsa rainha" cumpre seu papel, e diz-lhe ao cardeal de Rohan que "todo o anterior está esquecido"; embevecido, o cardeal não acha resposta, e aturdido, aceita que a falsa Rainha volte rapidamente, com a escusa de que vão sentir sua falta no palácio.

Finalizado com sucesso o encontro, o cardeal vê-se já como Premiê da França. No entanto, não vê maneira de começar a ser recebido publicamente pela rainha. Jeanne de Valois sugere-lhe que quiçá deva congraciar-se com a mesma por médio de gestos de extraordinária generosidade. Assim, a condessa faz que supostas obras de caridade de María Antonieta comecem a ser sufragadas pelo cardeal: a rainha deseja pagar uma dívida de 50.000 libras contraída por uma antiga família da França, mas carece de fundos para isso; como toda a França sabia que a Rainha sempre andava metida em dívidas, o cardeal não duvida em se fazer cargo do assunto, e abona a Jeanne de Valois as 50.000 libras para que lhas entregue à Rainha. Depois disto, os Valois da Motte consideram feita sua fortuna; de vez em quando escreverão uma carta da rainha para o cardeal, o qual abonará a obra de caridade por intermedio da condesa Valois da Motte. O comboio de vida dos de Valois da Motte faz-se extraordinário graças a isso; no entanto, depende de manter sua influência sobre o cardeal, o qual, felizmente, se tinha visto forçado a voltar à Alsacia para atender assuntos de sua diócese.

O assunto do colar

Por aqueles tempos então, os joalheiros da corte Charles Boehmer e Marc Bassenge, se vêem em um grande aperto económico. Luis XV tinha encomendado para sua amante Madame du Barry um soberbo colar de diamantes a estes dois joalheiros. No entanto, a morte de Luis XV frustrou a operação, e os joalheiros tiveram que se contentar com o prejuízo do caríssimo colar. Desesperados, o tinham oferecido a corte de Espanha, e, ante a negativa de Carlos III a pagar os dois milhões de libras que pediam por ele, de volta a Versalles, onde o colar tinha acordado a admiração de María Antonieta já em 1782, que, pelo demais, também não se achava em condições de desembolsar o milhão setecentas mil libras que tinham pedido os joalheiros. Incapazes de vender o colar devido o altíssimo preço, os joalheiros estavam a ponto de  desfazer o colar quando sua existência chegou aos ouvidos da condesa Jeanne de Valois da Motte.
Usando seu nome e suposta amizade com a Rainha, a condessa consegue que em 29 de dezembro de 1784 os dois joalheiros lhe mostrem o colar. Admirada ante tal magnificência, a condessa decide fazer com o colar um favor ao cardeal. Faz-lhe saber que a rainha, dantes da pública reconciliação, precisa de um último favor do cardeal: deseja comprar um luxuoso colar, mas carece de efectivo para isso; propõe ao cardeal de Rohan que o compre em seu nome, e que posteriormente ela lhe abonará o custo do colar conforme cheguem os prazos; isto é, propõe ao cardeal de Rohan que atue como seu avalista e testa de ferro na compra do colar.
O cardeal, ainda que contente pela mostra de confiança que acha que lhe faz a Rainha, se mostra receioso: apesar de ser fabulosamente rico, o preço do colar, avaliado em até um milhão seiscentas mil libras, não deixa de lhe parecer uma exorbitância. Não obstante, acaba por aceder: com a cumplicidade oportuna de Cagliostro, o místico maçóm amigo do cardeal, a condesa consegue convencer ao prelado de que um oráculo confirma a conveniencia do assunto. A 29 de janeiro de 1785, o cardeal, totalmente convencido, compra o colar por um milhão seiscentas mil libras pagas em dois anos em quatro prazos semestrais, e entrega-lho à da Motte em 1 de fevereiro de 1785 que por sua vez, dá-lhe em presença do cardeal, e no meio de um grande segredo, a um suposto lacaio da Rainha, em realidade seu cúmplice Rétaux de Villette. Por ter favorecido esta negociação o joalheiro presentear-lhe-á com várias jóias.
Descoberta da fraude

 
Com o colar em suas mãos, os Valois da Motte acham-se em posse de uma fabulosa fortuna, maior do que tivessem sonhado. Desfazem o colar, e Rétaux de Villette começa a vender os diamantes do colar. Sua cobiça prejudica-os, pois pretendem vender diamantes por mais do efectivo que nenhum joalheiro de Paris possa dispor. Vêem-se com isso forçados a vender a baixo preço, o qual acorda receios e as queixas entre os joalheiros de Paris, que vêem cair o preço dos diamantes em consequência das vendas feitas pelos da Motte. Decidem queixar-se ante a polícia, transmitindo suas suspeitas de que os diamantes que Rétaux estão a vender são roubados. A polícia de Paris detém a Rétaux e interroga-o sobre a procedência dos diamantes; ao inteirar-se que são da supostamente poderosa condesa de Valois da Motte, o deixam em liberdade. Esta, não obstante, se dá conta do arriscado da operação, e o envia a seu esposo com o resto do colar a Londres, onde os joalheiros e banqueiros londrinos não fazem perguntas sobre uns diamantes vendidos a baixo preço.

Com os rendimentos da venda dos diamantes, os Valois retiram-se a Bar-sul-Aube, onde tinham adquirido previamente uma residência, e começam a viver com padrão de vida muito alto, sem que seu fastuoso estilo de vida levante suspeitas sobre a misteriosa origem de sua fortuna nem tão pouco sequer no próprio cardeal de Rohan, que não entende por que a rainha não use nunca o colar que  comprou. A condessa justifica isto com a desculpa de que a Rainha não deseja que seu esposo Luis XVI saiba que o tem até que esteja completamente pago, por ser talvez o Rei , conhecido por sua prudência econômica, desejasse devolver o carísimo colar. O cardeal dá-se por satisfeito, enquanto, no meio de uma vida de exorbitante luxo, a condesa convence-se a si mesma de que, em caso que o cardeal de Rohan se de conta da fraude, preferirá se manter em silêncio para evitar a pública humilhação de reconhecer que os Valois da Motte lhe defraudaram, ao todo, cerca de dois milhões de libras.

No entanto, a condessa não conhece os detalhes do contrato de compra que tinha assinado o cardeal de Rohan com os joalheiros, no que ficava claro que a destinatária e última pagadora do colar ia ser a Rainha. Conforme acerca-se o 1 de agosto de 1785, dia de vencimento do primeiro pagamento de 400.000 libras que tinha de fazer a Rainha ao cardeal, e este por sua vez aos joalheiros. A condessa começa a se dar conta de que toda sua fraude é tremendamente frágil, e ainda  conta com a possibilidade de que o cardeal, uma vez que, descubra que a Rainha não lhe vai pagar o colar, e com isso a fraude, não de importancia  ao assunto, decide por se talvez ganhar tempo pedindo aos joalheiros, em nome da Rainha, uma baixa no preço do colar de 200.000 libras, com o que espera desviar a atenção.

Os joalheiros, que mal podem sustentar sua penosa situação, decidem por fim ceder à redução do preço. Mas, em vez de comunicar-lhe à condessa, Charles Boehmer aproveita que o 12 de julho tem de se reunir com a Rainha para lhe entregar umas jóias e igualmente lhe entregar uma carta na qual lhe comunicam, em uma linguagem um tanto opaca e muito elogiosa, que "aceitam humildemente sua petição de redução". María Antonieta lê a carta, e não entende nada; destrói, como é habitual nela, a carta, achando que se trata de um escuro agradecimento escrito por parte de Boehmer. Boehmer, por sua vez, crê fechado ao fim o negócio.

Conforme acerca-se o dia do primeiro pagamento, não obstante, a condessa vai-se dando conta de que o joalheiro vai exigir o pagamento. Desesperada, decide por ao conhecimento dos joalheiros a fraude: envia-lhes uma carta na qual reconhece que a garantia de pagamento que o cardeal possui em nome da Rainha é falsa, mas que o cardeal, sendo rico, pode lhes pagar ele mesmo o colar. No entanto, os joalheiros desconfiam do cardeal, que sempre anda endividado e desesperados como estão, se apresentam ante a Rainha, achando que é ela a que possui o colar. Boehmer apresenta-se em Versalles o 13 de agosto, María Antonieta recebe-o, e em menos de um minuto descobre o joalheiro que a Rainha não tem o colar, nem tem conhecimento de nada sobre o assunto. Ao interrogar a Boehmer, descobre que o colar foi comprado pelo cardeal de Rohan em seu nome; María Antonieta, que, por influência de sua mãe María Teresa, despreza profundamente  de Rohan, se sente ultrajada por essa estratagema, na que crê ver uma vingança do próprio cardeal, a quem considera seu inimigo. Não se mostra disposta a passar por alto como de Rohan tem usado, supostamente, seu nome em seu próprio proveito, misturando em uma fraude.

Assim, a Rainha María Antonieta informa de maneira quase imediata a seu marido Luis XVI, e a 14 de agosto lhe exige que atue imediatamente contra o cardeal de Rohan, a quem acusa de ter usurpado do seu bom nome. Ao dia seguinte, a 15 de agosto, quando o cardeal –que é capelão do Rei- se prepara para celebrar com grande cerimónia a festa da Assunção, o Rei o chama a seu despacho privado e, em presença de María Antonieta, se vê obrigado a dar explicações a respeito do expediente apresentado contra ele. De Rohan mostra-se confundido, pois ainda acreditava contar com o favor da Rainha; pouco a pouco vai-se dando conta da fraude da que tem sido objeto e confessa ao Rei o novelesca envolvimento da condessa de Valois da Motte, de quem nem o Rei nem a Rainha tinham ouvido falar. A ira de María Antonieta, que acha que o cardeal a insulta ainda mais com essa história, cresce até o ponto de que urge a seu marido a que detenha imediatamente ao cardeal; Luis XVI cede, e, ante toda o corte reunida para a Assunção, o cardeal de Rohan é preso publicamente e encarcerado na Bastilla.

Processo e escandalo

 
 Conde Alessandro de Cagliostro, que se viu misturado no Assunto do Colar, teve que abandonar a França em consequência do mesmo. Ao deter o cardeal de Rohan de maneira pública explode um grande escandalo. A nobreza francesa, desde sempre inimiga com a Rainha, se sente atacada e insultada por tal manobra. O cardeal de Rohan é membro de uma das primeiras famílias da França, e o trato como foi recebido, sendo detido de maneira pública como a um vulgar ladrão, indigna profundamente à nobreza, que, considerando a Luis XVI como a uma pessoa débil e bonachona, não duvida em acusar a María Antonieta de ter orquestado todo o assunto para humilhar publicamente não só a de Rohan, senão à nobreza francesa em seu conjunto; imediatamente, toda a velha nobreza se posiciona a favor de de Rohan, e começa a instigar uma campanha de desprestigio contra a Rainha. Ao tempo, conforme vão-se conhecendo os detalhes da fraude, uma onda de indignação sacode ao povo da França, ao conhecer que enquanto eles mal vivem com uns poucos salários (centésima parte da libra), há nobres que gastam milhões em exorbitantes colares de diamantes.

Pouco depois da detenção de de Rohan, a própria condessa de Valois da Motte, claramente implicada no assunto, é detida; seu marido, por sua vez, havia fugido pra Londres com os últimos diamantes, e Rétaux de Villette já estava na Suíça. Igualmente, são detidos Nicole Leguay, a prostituta impostora da Rainha, e o místico Cagliostro, suspeito de se encontrar em cumplicidade com a condessa.

A instrução do caso, pretendidamente discreta, faz-se em realidade de maneira pública, e levanta um grande interesse tanto dentro como fora da França. Por último, os soberanos permitem-lhe escolher ao cardeal entre a Justiça do Rei ou a do Parlamento de Paris (uma sorte de Tribunal Supremo da França, que tinha sido reinstaurado por Luis XVI depois de sua abolição no reinado de Luis XV). O cardeal elege, habilmente, esta última, forçando um processo público dirigido por membros da própria nobreza, que compunham o tribunal.

A 22 de maio abre-se o processo no Parlamento de Paris. Desde um primeiro momento, fica claro que o processo vai além do assunto material do colar, ao se enfrentar, por um lado, a Rainha María Antonieta, que tão torpemente tinha forçado o assunto, e por outro a nobreza francesa que tanto a odeia. Qualquer sentença condenatoria para o cardeal fica excluída, ao estar claro que foi vítima de uma fraude. No entanto, o Parlamento deve eleger entre uma absolvição com reprovação para a conduta do cardeal, que usou o nome da Rainha sem seu consentimento, o qual afiançaría a posição de María Antonieta, ou uma absolvição completa, o qual afundaria a María Antonieta. As pressões sobre o tribunal são imensas, e depois de uma longa deliberação o Parlamento absolve, por vinte e seis votos em frente a vinte e três, de maneira completa ao cardeal de Rohan, a Nicole Leguay (a prostituta) e a Cagliostro, humilhando publicamente a Rainha e a monarquia francesa, cujo prestígio interno derruba-se. Igualmente, condena in absentia a Rétaux de Villette ao desterro, ao conde da Motte as galeras perpetuas, e a condessa é condenada a prisão perpétua em Salpêtriére.




Furiosa, María Antonieta pede ao Rei que o cardeal de Rohan faça sua renúncia como Capelão do Rei e seja exilado à Maison de Dieu, uma das abadias usufrutuarias do cardeal. O Rei aceita, e depois da sentença desterra o cardeal, ato que o povo e a nobreza vê como um atropelo à decisão do Parlamento,  ainda mas se cabe a imagem da monarquia francesa. O desterro, não obstante, só durará três anos, já que a 17 de março de 1788 o Rei autorizá-lo-á a regressar a sua Diocese. 

Por sua vez, poucas semanas após sua condenação, a condessa de Valois da Motte foge para Inglaterra: alguém (se desconhece quem) lhe abre a porta de sua cela e a ajuda a sair de prisão. Conforme a indignação geral pelos detalhes do processo, que põem de manifesto o insulto da corte, a condessa, refugiada em Londres, se dedica a incitar ainda mais o assunto. Publica umas memórias nas que mostra a María Antonieta como a uma sádica lesbiana dada a todo o tipo de infidelidades, orgías e deboches, e contribui com isso pra afundar a imagem pública da Rainha. Depois de estourar a Revolução Francesa em 1789, a Convenção, que vê nela  uma sorte de heroína trágica vítima da maldade de María Antonieta, a convida a regressar a França em 1791 com todas as honras. No entanto, pouco antes de regressar, a condessa atira-se, em 1791 da janela de sua casa em Londres em um ataque de histeria.


Obs: Texto de dificil tradução, tive que adaptar alguns termos sem ferir o corpo do texto, para que os leitores entendessem tão truncado assunto. Há alguns erros de gramática, porém não corrigi, diante de tradução tão complicada, optei por deixar para não alterar ainda mais o entendimento da História.
Elsy Myrian Pantoja




 


Bibliografía

Frantz Funck-Brentano, L'affaire du collier. - A mort de reine-a.

Stefan Zweig, Marie Antoinette.

John Haslip, Marie Antoinette.

Frantz Funck-Brentano, L’affaire du collier, d’après de nouveaux documents recueillis em partie par A. Bégis, Paris, 1901.

Jean-Claude Fauveau, Lhe prince Louis cardinal de Rohan-Guéméné ou lhes diamants du roi, L’Harmattan. 2007.em:Affair of the Diamond Necklace

Obtido em "http://pt.wikilingue.com/es/Assunto_do_colar"



 

DE PROFUNDIS



Ninguém foi tão profundo falando de sí mesmo- Oscar Wilde

Não sou do tipo que gosta de fazer apologia a movimentos tidos como "politicamente incorretos", nem de ir contra todos simplesmente pelo fato de querer ser diferente. Muito pelo contrário, quase sempre concordo com o que é "sensato"e com a "razão". Mas... o que é sensatez? Como definir a razão?

Em 1905, Robert Ross publicou uma série de relatos em forma epistolar de um grande amigo e escritor do século XIX, Oscar Wilde. Os relatos em questão são conhecidos pelo nome De Profundis. O livro é, em resumo, a defesa que foi negada a Wilde durante o julgamento que deu início ao fim de sua vida, uma defesa que ninguém se interessou por ouvir já que todos concordavam que Wilde havia "ferido a moral" da sociedade conservadora inglesa da época. Cada uma de suas partes corresponde às cartas que Wilde escrevia para o seu grande amor, na tentativa de fazê-lo entender como ele (o grande amor) havia destruído sua vida e nem olhado para trás a fim de pedir-lhe desculpas.

A história de vida de Wilde já é fascinante por si só. Escritor de peças assistidas por inúmeras figuras importantes da época, e sempre aclamado ao final das apresentações, este escritor irlandês (nascido em Dublin) altamente irônico e perspicaz praticamente abandonou tudo que havia conseguido graças a sua arte para se unir a um jovem mesquinho, egoísta e extremamente fútil, Sir Alfred Douglas.

Após lançar A Importância de Ser Prudente (The Importance of Being Earnest), peça extremamente hilária, e seu maior sucesso sem sombra de dúvidas, a vida de Wilde parecia ter chegado ao auge. Mas uma armadilha do destino levou-o a conhecer Sir Alfred Douglas, jovem de futuro promissor que passava por algumas dificuldades na universidade, e que foi apresentado a Wilde exatamente por isso, uma vez que viam no escritor um grande exemplo para jovens estudiosos. Wilde já havia descoberto sua homossexualidade e conseqüente atração por pupilos, mas tudo não havia passado de distrações até Bosie (como Sir Alfred era conhecido) aparecer em sua vida. Devotando a este jovem todo seu amor, paixão, dinheiro e, até mesmo, a própria arte, Wilde gradualmente deu início ao seu fim, até a morte. Uma vez que o homossexualismo era severamente condenado em sua época, Wilde foi mandado para a prisão em nome do amor, amor por seu "Bosie". Após um infeliz julgamento, iniciado pelo pai de Bosie, Wilde viu-se totalmente cercado de inimigos e falsos moralistas que o acusavam de ter "ferido a moral" ao manter relações íntimas com outro homem, não se importando com o tamanho dos danos que assim causavam à sua vida e à de sua família. Esta é a história real de De Profundis, um dos melhores auto-retratos já escritos por um poeta que, mais do que ninguém, conheceu o verdadeiro significado da palavra "amor".

Durante os dois anos que passou na prisão, Wilde escreveu todos os altos e baixos de sua conturbada "amizade" (como gostava de se referir) com Sir Alfred. Parecido com um diário, De Profundis é o coração e a alma de Oscar Wilde em suas versões mais explícitas e sinceras. E o que mais chama a atenção nesta singular narrativa é o fato de ele nunca ter feito sequer uma revisão na obra. Isso porque, na prisão, apenas duas folhas de papel lhe eram entregues por dia e, mesmo assim, retiradas ao final da tarde, para serem entregues de volta somente na data de sua libertação. Significa dizer que a versão que podemos contemplar hoje, em pleno ano 2002, e quase 100 anos após a primeira edição, é exatamente a mesma que Robert Ross publicou em 1905!

Oscar Wilde foi um exemplo de homem que seguiu seus impulsos e suportou as conseqüências até o fim. Sim, até o fim, pois mesmo depois de liberto, já totalmente esquecido e ignorado por seu grande amor, Wilde procurou Bosie para se decepcionar pela última vez. E morrer doente e sozinho, a não ser por seu fiel amigo Robert Ross.

De Profundis não é apenas a história de Oscar Wilde contada por quem a sofreu na pele; é a história de um grande homem que sofreu por amar, que quebrou as regras para viver o que acreditava ser o certo, seguir sua razão. De Profundis é a prova de que podemos chegar a este nível de amadurecimento. Porque razão é ver sentido no que se faz. E só o amor pode fazer coisas absurdas fazerem sentido.


Por Giselle Fleury